segunda-feira, 23 de abril de 2012

Naqueles dias 99%...


Então abril veio e a segunda quinzena já vai passando. O outono também já veio pro Vale do Paraibuna, mas tá de conchavo com o verão a fim de impedir as fêmeas da espécie humana a dar um upgrade no guarda-roupa e começar a usar aquelas roupitas de meia-estação, principalmente...
Num domingão 99% bissexto...
     Aí... Nesse dia 99% bissexto, domingão de um outono 99% bissexto e 1% restos de um verão, que insiste riscar os céus de tardinha cinzenta, com relâmpagos de tempestade tardia... E isto sem contar as altas temperaturas, que insistem em impedir que fêmeas da espécie humana iniciem o ritual de passagem de estação e comecem a guarnecer o guarda-roupa, com aquelas roupitas e acessórios e perfumes de meia-estação, que só uma outonal dama conhece!!! 
    Aliás, não é só ele que permanece nas redondezas, tentando alongar a estação anterior, ignorando completamente a ordem da natureza. Dona Pardaloca que o diga! Ao invés de caçar abrigo para filhotes, na estação fria que por certo virá, a criatura divina fica se empanturrando de migalhas saborosas, porém venenosas para aves e similares, que ficam em cima da mesa da cozinha, após o café da manhã! 
    E tem mais a colônia de joão-de-barro ainda não se definiu. Cada casal resolveu fazer a portinha da casinha virada para um lado e, assim naturalistas ficam prejudicados para apontar a direção das chuvas... Isto tudo e mais um casal de rolinhas que, mesmo sendo apedrejadas por aqueles menininhos banguelinhas – primos de Pimentinha* – insistem em ir comer as poucas florzinhas do pé de jabuticaba do vizinho! E Mamãe Sabiá, que se aborreceu deveras com o filhote, que se aproximou demais de uma arapuca armada pelo menino da rua debaixo... Deixou o pimpolho de castigo no ninho e tá que faz um não-sei-o-quê na garagem da vizinha. 
    Então... Como eu tava falando... Com você mesmo, caro (a) leitor (a)!  Eu tava lhe falando de um domingão bissexto e outonal, com uma tempestade de verão à vista! 
    Pois é... A família estava dividida – não de coração – mas de ocupação... A filha tava com o namorado, no notebook dela e na mesa de estudos dela, namorando e ao mesmo tempo tentando terminando mais uma tarefa dura e árdua da faculdade de arquitetura. O marido tava naquele famoso sofá, motivo de arenga do casal, onde ele se acomoda, para dormir todas as partidas de futebol... Sim, caro (a) leitor (a)... Todas! Uma em cada canal, pois ele tem a arte de cochilar e manobrar o controle remoto ao mesmo tempo, em busca de mais emoções, que acalentem o final de domingo burocraticamente bissexto. Eu tava tentando ajudar uma amiga a montar um projeto de preservação do meio-ambiente, pesquisando umas coisas aí no Google**...  
    Já tínhamos tomado o café da tarde e tudo parecia se encaminhar para o rotineiro, para o costumeiro... Quando um pé-de-vento, destes bem entrão, anunciou aquela tempestade não sei se tropical, se equatorial ou? ... Quem sabe?... Polar?... Huummm! Seria uma excelente desculpa para eu vestir um modelito que já customizei para o inverno... Mas aí... 
    Então... Aí se deu o apagão! Sem energia elétrica, sem telefone fixo, celular sem rede e internet nem pensar nem com bateria!  
    A gente pensou que ia voltar rapidinho, mas deu 7... Deu 8 e nada! Aí o melhor  foi providenciar um jantar á luz de vela... Em família e em vizinhança, pois fornecemos velas a vários vizinhos desprevenidos. A amiga que estava tentando fazer contato com a plataforma - não sideral mas universitária – acabou jantando, e se arriscou, indo pra casa no escuro mesmo. 
     ─ Cheguei bem! – disse ela na msg*** que enviou. 
     Ufa! Aí deu 9, 10 ... E nada! Então nos restou a chance de ir pra cama mais cedo, curtindo “o silêncio dentro do silêncio” *¹ do silêncio do Monte Castelo. Quem dorme tem que acordar, ainda que o sonho seja daqueles que fazem a gente ficar com vontade de não voltar à real. E foi assim que acordamos, aqui   nesta vertente, no Vale do Paraibuna, de frente pra real: consumidores lesados durante horas sem comunicação e até hoje não ficamos sabendo o porquê!... 
    Mas por falar nisso, que  dia é hoje? Isto é uma outra história. Eu conto depois...

Então, abril vai se acabando... O outono parece que se deu conta que tava atrasado e deu às caras e pediu pra parar de chamá-lo de bissexto... E hoje... Mas que dia é hoje? O dia em que gente e bicho adiando as mudanças inclusive uma certa Dona Pombinha que anda arrulhando nos telhados de Monte Castelo e adjacências... E o que arrulha Dona Pombinha? Amanhãeuvoou! Mas se os Maias tiverem um pouco de razão... E se hoje for...
  Aquele último domingão 99% bissexto?...I
     Eeeeh... Caro (a) Leitor (a)... E se hoje for o último dia?  E se não houver amanhã? Como é que vai ficar Dona Pombinha e seus seguidores: 
    ─ Amanhãeuvoou! 
    ─ Ora, faça-me um favor, Dona Pombinha... E se não houver amanhã? 
     E assim com esta indagação, comecei o que bem poderia ser o último domingão 99% bissexto desta civilização... E fui logo ao mercado Lima, garantir o último molho de cheiro verde, elemento imprescindível a qualquer último molho de um franguinho à caçarola... 
    No caminho, dou de cara com uma senhora que ia arengando com o marido:
     ─ Não falei que não se pode deixar nada pra fazer amanhã... 
     ─ Arre... Para de falar... Eu vou dar um jeito... Amanhã... Eu dou um jeito... 
     ─ Amanhã... Amanhã... E se não tiver amanhã?  
     Eeeeh... Caro (a) Leitor (a), o negócio tá ficando feio! A ameaça maia parece se instalar e grassar, nesta vertente norte do Vale do Paraibuna...  
     Apressei meu passo a fim de não ser testemunha do que bem pode  ser a última briga de marido e mulher,  em que a gente não deve meter a colher... E na porta do mercadinho, enfrento o que poderia ser o último desafio da humanidade. Um novo tipo de esfinge*² do séc.XXI me propõe um enigma... Qual esfinge? Qual enigma?
     Pois é... Eu tava quase entrando no mercadinho, quando um danadinho de um menino de uns sete anos... Desses banguelinhas e bem danadinhos, cê sabe, né? Pois esta criança saltou na minha frente e me propõe a pegadinha do século: 
     ─ Tiaaah... Cê sabe qual é o dia que nunca chega?... 
     Ahn... Ahn... Inda bem que tenho uma série de respostas às pegadinhas de menininhos: 
     ─ Ah... Aaaaaah! Eu sei! É o amanhã!  
     ─ Mas... Por quê??? – indaga, em desafio maior ainda, o peralta. 
     ─ Huuum!É o amanhã porque quando ele chega já é hoje!!... 
     ─ E o hoje já é ontem! – completou a criatura divina!  
     Quando a esfinge-mirim já ia me lançar um outro enigma talvez mais insolúvel ainda, sua irmã – uma dessas adolescentes que ficam muito mal humoradas, porque tem sempre que levar o irmãozinho caçula não importa aonde for – arrastou o guri pro outro lado, onde fica a padaria.  
     Mas... Ele me deixou numa sinuca de bico... Se o amanhã é hoje e, hoje já é ontem, em que dia estamos então? Boa pergunta! Mas isso só respondo depois do depois... Pois o almoço está por fazer...


Então, eu tava lá no mercadinho... Lembra? Eu tinha passado pela esfinge séc.XXI... Lembra?... Mas tava numa sinuca de bico... Lembra?  Se o amanhã quando chega já é hoje, e o hoje já é ontem, em que dia estamos então? Será que é...
Aquele último domingão 99% bissexto?...II

     Eu já ia de volta com um mirradinho molho de cheiro verde, o único que consegui, repaginando o almoço dada a falta desses e outros ingredientes, avistando de longe a tal “esfingezinha”, quando de súbito me assalta uma conclusão filosófica, se é que se pode filosofar com um molhozinho de tempero nas mãos: 
     ─ Então... O amanhã é o dia que nunca chega... E quando chega já é hoje que, por conseguinte, já é ontem!  
     Ou seja, há séculos e séculos, somos enganados e fazemos planos para um dia que afinal nunca existiu e um outro que finge existir... 
     Prezado (a) Leitor (a), eis todo o paradoxo da humanidade: somos animais racionais, únicos capazes de rir, falar, chorar, pensar e de repente, somos surpreendidos arquitetando planos que com certeza não realizaremos porque amanhã será hoje e hoje já é ontem! E não precisamos nem dos Maias! 
     Aliás, que grande mentirosos! 2012 sequer chegou, pois estamos amarrados definitivamente ao dia de hoje, que pode ser ainda o da Criação... 
     Eheheh... Ainda bem que eu tenho a mania de cumprimentar todo o mundo, por isso fui salva de escorregar pelo abismo da dúvida do niilismo, da sociedade tecnológica em busca do... e blá...blá...blá...Uma vizinha, querida irmãzinha em Cristo, me cumprimentou alegremente. Então, eu parei de pensar para saudá-la e fomos as duas subindo a rua, ela falando e eu escutando:  
     ─ Irmã, o pastor da minha igreja pregou forte sobre a volta de Jesus... 
     E animada abriu sua Bíblia, com florzinhas douradas na capa, e me leu o versículo: 
     ─ “Vigiai, pois, porque não sabeis o dia nem a hora!” *³
     E me contou a parábola das 10 virgens. Embora eu conhecesse de cor a parábola e sua lição, fiquei quieta, ouvindo até que ao chegar na esquina da rua dela, ela se despediu: 
     ─ Paz no Senhor, irmã! 
     ─ Paz no Senhor... 
     Pois é... Então... O que era o amanhã ou o hoje ou o ontem ou que é qualquer dia pra quem tem a Paz do Senhor? Um dia de ser feliz! Entrei em casa cantarolando uma canção gospel e fui direto pra cozinha, preparar o almoço... 
    Almoçamos e descansamos. Uns ouviam música e outros dormiam o futebol, em todos os canais, é claro! E assim a tarde correu na Paz... E à tardinha, o céu cinzento anunciou a mudança de tempo...  Eh... Se não chover hoje, chove amanhã... 
     ─ Mas se não houver amanhã? 
    Em responsos a essa magna indagação de uma cidadã do séc. XX sobrevivendo ao séc. XXI e à ameaça maia, Dona Pombinha arrulhou o seu "amanhã eu vou”... E um vizinho cantarolou um verso de Renato – que Deus o tenha – um dos meus preferidos:  
    ─ “É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã...” #  
    Então... Se não sabemos se é hoje, ontem ou amanhã... Se não sabemos nem o dia nem a hora!...  Que viva la vida e o amor!!! 
    Aí a noite veio e com ela o silêncio dentro do silêncio*¹, aqui nesta vertente norte do vale do Paraibuna. Amanhã é 2ª feira  e vai começar tudo outra vez...  Mas... E se não houver amanhã? Ah! A gente pensa nisto  depois do depois... ???

*- Referência à personagem de HQ infantil e filme americano
**- Site da internet para pesquisa e acesso a blogs e às redes sociais; 
*** Msg – mensagem virtual; 
*¹ - Referência a poema e livro de Carlito Filho, morador do Monte Castelo em JF;
*2 – Referência  a esfinge, criatura mística usualmente tida como um leão estendido — animal com associações solares sacras, da cultura egípcia que depois aparece na mitologia grega que propõe enigmas – Decifra-me ou  devoro-te; 
*³ - Mateus 25:13;
 # – Referência a verso da música do Legião Urbana – Pais e Filhos.
Izabel Cristina Dutra, escrito em JF/MG, entre 16 e 23/04/2012.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Os decifradores de enigmas...


E aí março tinha chegado ao fim...  Abril não tardou! Todo trabalhado nos tons de um outono bissexto, nos feriadões e na tal enchente das goiabas.  Aí veio a Semana Santa, a Páscoa e a folga pra uns e plantão pra outros.  Agora com abril instalado no Vale do Paraibuna e adjacências, com a chuva chovendo metade do bairro sim e a outra metade não, eu tava lá indo ao Posto de Saúde, para aviar uma receita e Eles também tavam indo... Eles e a Mãe! Eles quem?...
Os decifradores de enigmas da natureza I 
(e também da língua portuguesa...) 
      Então... Pra vc. que tá chegando do feriadão e não vai nem desfazer as malas, porque vem aí um feriadinho... Pra vc. que ficou ficando e talvez fique outra vez pq ň tem nem tpo nem $... Pra vc.s, eu vou contar: 
     Pois é... De repente março... De repente 58!* E “de repente não mais que de repente”¹, eis que na terra e no céu, “as cores de abril”¹ , “as flores de abril”¹ e tudo de abril trabalhado nos tons desse outono bissexto, e com algumas casas e coisas indo correnteza, abaixo na enchente das goiabas.  
    Aí eu tava indo ao Posto de Saúde, que fica na metade que estava chovendo e Eles também tavam indo, com a mãe, na mesma direção... Eles? Aqueles meninos que surfam na grama da praça, em qualquer feriado ou qualquer dia de trampo... E que decifram símbolos, sinais, qualquer enigma da natureza em qualquer estação...  
    Eles me cumprimentaram com um sorriso. 
    ─ Quem é essa dona? – pergunta a Mãe. 
    ─ E a pressessora da bliblioteca da escola – responde Irmão Mais Novo. 
    ─ É pro-fes-ssso-raaa! Bi-bllii-ooo-teca, seu burro! – retruca Irmão Mais Velho. 
    ─ Ah... Já sei... – acrescentou a Mãe, correndo os olhos em mim, rapidinho... 
    Como eu tinha que ficar na fila da farmácia e eles na fila das vacinas, o debate foi adiado por uns longos 30 minutinhos e meio.  
    Pra mim, só o aborrecimento de saber que os remédios mais caros não foram enviados, neste mês. Mais uma despesinha-extra e o salário, oh!...** E como alguns “não querem saber de dor”¹, teve enfermeira correndo atrás de criancinha gritando que não queria ser espetado. 
    ─ Mas é só uma picadinha!... dizia a moça, sem convicção. 
    Na saída, tava chovendo na outra metade do bairro. Mesmo assim, vou devagarzinho por causa da lama que escorre da praça. E Eles vieram logo atrás.. Eles? Irmão mais Velho, Irmão mais novo e a Mãe com toda pressa do mundo. 
    Quando passaram por mim, a Mãe tava ralhando com o mais novo por conta do mico, na hora de vacinar. Ela desacelerou, me cumprimentou, e indagou:  
    ─ A senhora não tá mais lá na escola? 
    Explico pra ela que estou de licença-saúde, que se eu não aposentar agora, talvez volte por uns tempos. Ela quis saber por que eu estava usando apoio. Expliquei e até falei o nome do problema. Um nome chique de doer e dói mesmo: polineuropatia periférica de razão axonal!  
    ─ Credo! Isto é doença de rico! 
    ─ Pois é! Não podia ser uma lodorsezinha? 
    Rimos as duas, numa intimidade que só as mães têm! 
    Enquanto isso, os meninos corriam e chutavam poças d’ água e a Mãe intercalava perguntas e respostas, com advertências: 
    ─ Se chegar em casa com roupa suja de barro, vou botar pra lavar... E pode parar aí que eh vem carro aí! 
    Neste ponto tivemos que suspender a conversa, para atravessar a minha rua, que é bem movimentada principalmente na 2ª feira, quando instrutores, alunos e examinadores aportam aqui para os testes!  Aí... Enquanto não engrossam os engarrafamentos do centro dessa cidade-vale, eles ficam aqui alterando “o silêncio dentro do silêncio”² do nosso bairro. Embora lá atravessar com cautela...

E aí março tinha chegado ao fim...  Abril não tardou! Lembra? Todo trabalhado nos tons de um outono bissexto, nos feriadões e na tal enchente das goiabas.  Lembra? Aí veio a Semana Santa, a Páscoa e, a folga pra uns e plantão pra outros. Lembra! Agora com abril instalado, e a chuva chovendo metade do bairro sim e a outra metade não. Eu tava lá voltando Posto de Saúde, onde tinha ido aviar um receita  e Eles também  tavam voltando também.  Eu e Eles tínhamos parado na esquina da minha rua e atravessamos com cautela. Eu,Eles e a Mãe! Eles quem?...

Os decifradores de enigmas da natureza II 
(e também da língua portuguesa...)  
    Pois é... Então... Pra vc. que tava chegando do feriadão e não vai nem desfazer as malas, porque eh vem aí mais um feriadinho... Pra vc. que ficou ficando e talvez fique outra vez pq ň tem nem tpo nem $... Pra vc. s, eu tava contando: 
    Pois é... De repente março... De repente 58!* E “de repente não mais que de repente”¹, eis que na terra e nos céus, “as cores de abril”¹, “as flores de abril”¹ e tudo de abril trabalhado nos tons desse outono bissexto, e com algumas casas e coisas indo correnteza, abaixo na enchente das goiabas. 
    Aqui entre este Monte Castelo no vale do Paraibuna, eu e Eles estávamos voltando do Posto de Saúde, lembra? Eles? Aqueles meninos que surfam na grama da praça, em feriados, feriadinhos, feriadões e até em dia de trampo. 
   A gente estava atravessando a minha rua, quando demos um tempo na conversa para não colidirmos com mais de sete carros de auto-escola cercados de gente de dentro do DETRAN e gente de fora chorando porque passar nestes exames de direção é mais difícil que um “camelo passar no buraco de agulha” ***. 
    Do outro lado, na outra esquina, a gente descobriu que só tava chovendo no meio, em cima da gente e no povo dos testes. No mais, o céu se dividia em uma faixa de cinza com amarelo e um com pinceladas de branco.  Então,Eles iniciaram uma batalha de cantilenas...
    ─ Soool com chuva, casamento de viúúúva!... – cantarolou Irmão Mais Novo! 
    ─ Chuva com soool, casamento de espanhoool!... – esganiçou Irmão Mais Velho! 
   A  Mãe deu paradeiro na cantoria, mas não conseguimos evitar um comentário sobre este outono esquisito, com temporais e tudo mais. Aí Eles interviram novamente: 
    ─ É o buraco na camada do Ozonho! – afirmou Irmão Mais Novo. 
    ─ É buraco na camada do Ozz-zzô-nii-yô, seu burrinho!  
     Então entrei na brincadeirinha: 
    ─ Então o O-zô-ni-yô deixa fazer buraco na camada dele e a gente que aguenta as consequências? 
    ─ Não... É nós mermo que fez este buraco, poluindo tudo... – afirmou o sabidinho Irmão Mais Novo... 
    ─ É a gente que fizemos, seu burro! – consertou o chato do Irmão Mais Velho. 
    Eu bem que desejei ser uma menininha banguelinha, de sete anos, só pra retrucar: 
    ─ Irmão de burrinho, burro é... é...! 
    Mas não convinha nem dava tempo... Mãe retomou a pressa e nos despedimos. Eu fui subindo em direção à minha casa e eles quebraram à direita pra casa deles. 
    Bem... Parece que a manhã foi rendosa. Afinal, aprendi tudo sobre criança escapando da vacinação; contribuição humana para este outono esquisito com sua bissextuabilidade; e as diversas variantes do dialeto monte-castelano da língua  luso-brasileira. 
    Mas antes que eu alcançasse o portão, uma mãozinha segurou a minha e ganhei um beijinho estalidinho na palma esquerda: 
    ─  Tiaah... Fica os anjinhos, tá bem?  – sussurrou Irmão Mais Novo, e desceu correndo porque Mãe já esganiçava lá na outra esquina: 
    ─ Ô... Ade-yl-is-son.. Vamos embora, mi-ni-no!
     Foi com certeza uma manhã de outono bem movimentada! Inda por cima, dou de cara com Dona Pardaloca se empanturrando de farelos de pão que esqueci num pratinho em cima de mesa. Ela me olhou, depois revoou acintosamente a cozinha e área e se foi, não antes de arriscar outra olhadela... 
    ─ Aí, humana! Fui! 
    Será que os anjinhos poderão me decifrar o enigma ou o ê-ni-gui- y-má desta preferência alimentar quase suicida  desses pássaros, aqui entre estes montes, no Vale do Paraibuna?


 * - Crônica da autora, postada em março/2012.
** - referência a bordão usado por Chico Anísio (in memorian)
*** - referência a texto bíblico.
" ¹ - referência a  versos de canção da MPB do poeta de Vinícius de Moraes.
"² - referência a poema-título do livro "O silêncio dentro  do silêncio" de Carlito Filho, morador do bairro Monte Castelo.